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De brigas à conexão: Dicas de uma Advogada, Sexóloga e Analista Comportamental que já ajudou milhares de casais a resgatar a harmonia, a intimidade e a paixão no casamento.
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Olá, queridos leitores!

Em nossa coluna, vou sempre abordar a complexidade dos laços afetivos. E hoje, focaremos em um fenômeno que transforma a paisagem familiar e que se tornou um tema quente para sociólogos e psicanalistas: o divórcio grisalho (em inglês, gray divorce). Estamos falando do aumento significativo de separações entre casais com mais de 50 anos, muitas vezes após décadas de casamento.

Por que, afinal, o juramento de “até que a morte nos separe” tem sido rompido justamente quando a fase de criação dos filhos termina e o ninho se esvazia? A resposta é multifatorial, e vamos desvendá-la sob a ótica da psicanálise e das transformações sociais.

 

Os Fatos e a Tendência: Um Fenômeno Global

Pesquisas confirmam a tendência. Nos Estados Unidos, por exemplo, embora a taxa geral de divórcio tenha diminuído, a taxa para adultos com mais de 50 anos dobrou desde os anos 90, segundo dados do National Center for Family & Marriage Research.

No Brasil, o cenário é semelhante. O IBGE registrou um aumento expressivo no divórcio de pessoas acima de 60 anos, refletindo um movimento de ressignificação da vida na maturidade. O divórcio grisalho não é apenas estatística; é a manifestação de uma profunda crise existencial tardia.

 

A Análise Psicanalítica: O “Vazio do Ninho” e o Reencontro com o Estranho

A psicanálise nos oferece lentes poderosas para entender porque essa ruptura acontece na maturidade:

  1. A Função do Casamento Como Escudo Social

Para a geração que se casava antes dos anos 2000, o casamento muitas vezes funcionava como uma identidade social e uma estrutura rígida de repetição. O casal adiava a confrontação das suas diferenças e neuroses, ocupado em “fazer o casamento funcionar” em função dos filhos e das obrigações financeiras.

  1. O Vazio e a Confrontação com o “Eu” Reprimido

Quando os filhos saem de casa (empty nest syndrome), a função estrutural do casamento se desfaz. O casal se encontra sozinho, e o que resta é, frequentemente, a confrontação com um estranho. O vínculo real, que foi negligenciado, é substituído por um vínculo utilitário de sociedade e logística.

O tempo livre força uma análise do seu desejo. Muitos parceiros percebem que a pessoa ao lado não é mais a parceria de amor, mas o co-administrador de uma vida que está no fim. Há um luto pela vida não vivida, e a separação é a tentativa de resgatá-la.

  1. A Negação da Finisterra – fim da vida

O divórcio grisalho é também uma tentativa de negar a finitude. Recomeçar a vida sexual, social e afetiva é uma forma de dizer “ainda há tempo, o roteiro da vida não acabou”. O novo parceiro (a), ou a nova vida, torna-se um símbolo de vitalidade e possibilidade, confrontando a estagnação outrora vivida – ou que se imaginava viver.

 

O Prazer Imediato e a Cultura do Descarte: A Ameaça Digital

É inegável que a sociedade atual, impulsionada pelas redes sociais e pela tecnologia, oferece uma cultura de prazeres rápidos e de descarte, que atinge também essa faixa etária.

  1. A Vitrine Constante: Aplicativos de relacionamento e redes sociais funcionam como uma vitrine de possibilidades infinitas. Para o indivíduo que se sente “preso” em uma relação morna, o acesso fácil a novas conexões (e, sim, novos prazeres sexuais imediatos) pode tornar o parceiro fixo menos atraente.
  2. A Tirania da Felicidade: Vivemos sob a pressão de que somos responsáveis pela nossa própria felicidade e que ela deve ser ostensivamente exibida. Isso estimula a busca incessante por um “eu ideal” e um “parceiro perfeito” (a utopia do prazer imediato), mesmo que isso signifique destruir o que já está construído.

Conclusão:

O divórcio grisalho é um sinal de que a vida na maturidade está sendo renegociada. Não é apenas uma crise conjugal; é uma crise cultural onde o tempo e a autonomia se tornaram bens mais valiosos que a permanência.

Mas fica o alerta: a estabilidade de um casamento não está no tempo que ele dura, mas na qualidade do desejo e do diálogo que os parceiros mantêm. O divórcio grisalho nos ensina que, se você não atualizar seu amor e seu desejo, a sociedade contemporânea fará o trabalho de desmantelá-lo por você.

A Escolha Diária: Atitudes para a Longevidade Conjugal

Como especialista em casais, acredito profundamente no poder transformador e duradouro do casamento. Estar junto por décadas não é sorte, mas sim uma escolha diária e uma construção ativa. Para aqueles que desejam prolongar o laço e não se tornarem estatística do divórcio grisalho, sugiro atitudes que resgatam o vínculo:

  1. Enxergar o Parceiro Além da Função: É vital desvincular o cônjuge do papel de co-administrador de contas ou pai/mãe de seus filhos. Reencontrem-se como namorados, como a pessoa que inspira o seu desejo, e não apenas a sua rotina.
  2. A “Atualização” Mútua: Assim como um software ou um app de celular, a relação precisa de updates. Invistam em conversas profundas sobre o que cada um se tornou na maturidade. Quais são seus novos sonhos? Que novos desejos surgiram? Evitem a armadilha de amar a memória do parceiro que existiu no passado, afinal nem você é mais o mesmo (a).
  3. A Rotina da Novidade: O tédio é o maior inimigo da relação estável. Quebrem a rotina com prazeres pequenos, mas intencionais. Agendem momentos que remetam ao início do relacionamento (uma viagem de fim de semana, um jantar fora sem falar dos problemas da casa) para injetar a adrenalina da novidade.
  4. A Recontratação Consciente: O casamento na maturidade deve ser uma renegociação ativa do contrato conjugal. Discutam e definam o novo formato de vida: o que é inegociável para a sua felicidade individual e o que vocês estão dispostos a construir juntos, agora com a liberdade do “ninho vazio”. O amor é um verbo; ele exige ação e renovação constante.

Escolher amar é escolher permanecer na construção, mesmo diante das turbulências da vida. A recompensa é uma parceria que se torna mais forte e significativa a cada ano.

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