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A PEC “Ali Babá” da Blindagem e os 80 ladrões
A cronologia sempre constitui elemento importante para desvendar crimes. Ou, como neste caso, a esclarecer intenções criminosas não-concretizadas. Vamos a ela:
Setembro de 2025: A Câmara dos Deputados aprova a PEC conhecida como “da Blindagem”. Maioria esmagadora. A Proposta estabelecia que o Supremo só poderia processar deputado ou senador com autorização prévia da Câmara ou do Senado.
A cara-de-pau ultrapassava qualquer limite. Deputados e senadores ganhariam alforria antecipada para a roubalheira e até para crimes como estupro e assassinato. Houve manifestações de repúdio nas ruas, nos meios de comunicação e nas redes sociais. O Senado sepultou a tal licença para roubar.
É importante registrar que os partidos que mais lutaram foram PL, PP e Republicanos. PL teve 85 votos favoráveis e nenhum contrário. PP, 46 e 2. Republicanos, 43 e 1. Nesses três partidos, houve 174 votos favoráveis à Blindagem e só 3 contrários.
Novembro de 2025: O relator do projeto de lei Antifacção na Câmara, Guilherme Derrite (PP-SP), insere no texto um dispositivo que condiciona a atuação federal em investigações (leia-se aí Polícia Federal e Receita Federal entre outras) a uma autorização prévia do governador do estado em que há a suspeita do crime.
Em dois meses, era a segunda tentativa de colocar um cabresto na Polícia Federal. A segunda tentativa de subordinar uma investigação federal a uma autorização política.
É importante registrar que Guilherme Derrite é deputado pelo PP de SP, um dos partidos campeões da tentativa da Blindagem, e secretário licenciado de Segurança Pública do governo Tarcísio de Freitas, de SP. Novamente há uma grita e novamente um recuo.
Dezembro de 2025: Uma operação da Polícia Federal faz buscas em endereços dos deputados Sóstenes Cavalcanti e Carlos Jordy, ambos do PL-RJ. O alvo é desvio de dinheiro de verbas parlamentares. Na casa de Cavalcanti a PF encontra R$ 470 mil em dinheiro.
É importante registrar que o partido dos dois é o PL, o campeão absoluto da tentativa da Blindagem.
A justificativa para as tentativas de vacinar deputados e senadores contra investigações é a de que operações da PF são usadas contra adversários políticos do governo ou críticos do STF para intimidação.
Os fatos indicam exatamente o oposto. As tentativas visam na verdade impedir que a roubalheira das emendas e do orçamento secreto (que ferem claramente o princípio constitucional da transparência) seja investigada. Até investigações em andamento passariam a depender da tal autorização política.
É importante registrar que um dia antes de Sóstenes e Jordy, uma outra operação da PF visou por fraudes no INSS o vice-lider do governo Lula no Senado, Weverton Rocha (PDT-MA) e o número 2 da Previdência, Adroaldo Portal, que foi preso.
Ou seja: o pau da PF nas costas de Chico também cantou nas costas de Francisco.
Na verdade, há mais ou menos (mais pra mais que pra menos) 80 deputados na mira da PF pela roubalheira das emendas.
80? Como assim? No conto do lenhador Ali Babá não eram só 40 ladrões? Sim. No conto da nossa cronologia do Congresso, há pelo menos o dobro. Um bando digno de figurar nas Mil e Uma Noites.
Com as emendas secretas, os mais de 80 membros dessa organização criminosa descobriram um Abre-te Sésamo para roubar o tesouro nacional pelo orçamento. Mas esqueceram o Fecha-te Sésamo e estão sendo flagrados pela PF. Nas Mil e Uma Noites, os 40 ladrões tentaram se esconder em botijões de azeite mas se deram mal. No caso dos 80 ladrões os jarros de azeite eram a PEC da Blindagem e o dispositivo que o relator Derrite tentou inserir no projeto de lei Antifacção. Também deu chabu nas duas vezes.
