Publicidade
Getting your Trinity Audio player ready...

A deselegância espalhafatosa do chanceler alemão

 

 

Angela Merkel e Friedrich Merz pertencem ao mesmo partido, UDC – União Democrata Cristã, de centro-direita. Os dois têm mais ou menos a mesma idade: ela, 71; e ele, 70. Alcançaram o topo da carreira política na Alemanha. Ela governou o país como chanceler, que é o nome da primeira-ministra lá, entre 2005 e 2021. Ele está nesse mesmo cargo desde maio.

As semelhanças terminam aí. Ela nasceu no signo de Câncer, e segue a religião luterana. Ele é nativo de Escorpião e católico. Ela se graduou em Química Quântica e trabalhou como cientista, pesquisadora. Ele cursou direito e trabalhou como advogado e lobista.

Como neto de alemão, costumo acompanhar com interesse as coisas de lá. Fiquei surpreendido nas últimas semanas com as grosserias de Merz.

Uma em relação a Belém, a cidade que acolheu a COP 30, conferência do clima da qual o chanceler alemão veio participar. De volta à Alemanha, Merz disse que perguntou a alguns jornalistas alemães que participaram da cobertura da COP, quem gostaria de ficar no Brasil, “especialmente naquele lugar onde estávamos (Belém)” e que ninguém levantou a mão.

Alguns dias depois, andou pela África, cumprindo agenda anti-diplomática. Passou pela África do Sul e por Angola. Já de volta, numa padaria alemã, emitiu uma observação definida por um jornal do país dele como “desconcertante”. Disse que não encontrou no buffet do hotel, em Luanda, um pedaço de pão “decente” para comer.  

Na época da universidade, li o livro O Maior Vendedor do Mundo, do autor Og Mandino. Adotei como mandamento uma orientação desse livro: “Se você pode falar bem de alguém, fale. Se só pode falar mal, cale.”

Reconheço que de lá para cá o mundo mudou muito. Hoje espinafrar alguém nas redes sociais rende likes, seguidores e monetiza. Quanto mais aguda e agressiva, quanto mais chula e gritada a ofensa, e quanto mais conhecida a pessoa xingada, mais repercussão e mais dindin. Pode até render votos e mandatos.

Mas mesmo reconhecendo essa pegada toda do xingamento na internet, continuo seguindo o mandamento de Mandino. Com o tempo, até aperfeiçoei. Penso na energia das palavras. Prefiro expressar “ajudar o bem” do que “combater o mal”. Lógico que isso é de cada um. E lógico também que ainda escorrego muitas vezes.

Ao menosprezar os atributos de Belém e de Luanda para incensar os equivalentes alemães, Merz talvez esteja adotando a estratégia de bajular o setor mais xenofóbico dos alemães. Acariciando um certo ufanismo nacionalista.  

Precisa disso?

Nos 16 anos em que Merkel governou a Alemanha, não lembro de nenhuma atitude dela que lembrasse minimamente essa arrogância ufanista com objetivos eleitoreiros. E ela ganhou 4 eleições seguidas. Tornou-se a mais longeva chefe de governo da União Europeia.

Lembro, pelo contrário, do remédio anti-popular, quando necessário. Em 2010, nunca esqueci, Merkel cortou despesas drasticamente no orçamento alemão para enfrentar aquela crise financeira que o Lula disse que aqui seria só uma marolinha e que devastou o país. O corte de Merkel representou o pacote de maior austeridade fiscal na Alemanha, desde a Segunda Guerra. Cortou na carne. Só preservou duas áreas: educação e pesquisa. As duas áreas que preparam o futuro. No orçamento brasileiro, o primeiro corte de Dilma foi na Educação: R$ 7 bilhões.

A comparação dos estilos antagônicos, a elegância discreta de da Merkel futurista , e a agressividade malcriada do Merz imediatista, faz lembrar uma frase clássica:

“O estadista pensa nas próximas gerações. O político pensa nas próximas eleições.”

 

Destaques ISN

Relacionadas

Menu