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De brigas à conexão: Dicas de uma Advogada, Sexóloga e Analista Comportamental que já ajudou milhares de casais a resgatar a harmonia, a intimidade e a paixão no casamento.
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A depressão, uma condição de saúde mental complexa e debilitante, não afeta apenas o indivíduo que a vivencia, mas reverbera por todo o seu círculo social, especialmente no relacionamento amoroso. Por isso, é fundamental abordar a importância crítica do parceiro como agente de suporte, compreensão e incentivo à busca por tratamento.

 

O Impacto da Depressão no Vínculo Afetivo

A doença traz consigo sintomas como o isolamento, a perda de interesse em atividades prazerosas (incluindo a intimidade), a baixa autoestima e, muitas vezes, uma irritabilidade ou humor deprimido persistente. Para o parceiro que não compreende a natureza da depressão, essas manifestações podem ser interpretadas erroneamente como:

  • Falta de amor ou interesse no relacionamento.
  • Preguiça ou “má vontade” em sair do estado de prostração.
  • Rejeição pessoal das tentativas de ajuda ou carinho.

A resposta instintiva e equivocada, como a rudeza, a cobrança ou a minimização do sofrimento (“Isso não é nada”, “Você precisa reagir”), não apenas agrava o quadro, mas atua como um potente fator de isolamento. Essa atitude destrutiva faz com que a pessoa deprimida se sinta ainda mais culpada, incompreendida e indigna de afeto, diminuindo drasticamente a chance de se abrir e aceitar a ajuda profissional essencial para a sua recuperação.

 

O Parceiro como Pilar de Apoio e Resiliência

O papel do companheiro(a) é o de ser um pilar de apoio e validação, demonstrando que o amor e o compromisso persistem, apesar da doença. Isso não significa assumir o papel de terapeuta ou curador, mas sim:

  1. Informar-se sobre a Depressão: Compreender que a depressão é uma condição médica que afeta o cérebro e o humor, e não uma falha de caráter. Esse conhecimento afasta o julgamento.
  2. Praticar a Escuta Ativa e Empática: Ouvir sem interrupções, críticas ou a necessidade de oferecer soluções imediatas. Validar os sentimentos (“Eu vejo o quanto você está sofrendo, e estou aqui com você”) é mais importante do que tentar animar.
  3. Incentivar a Busca por Ajuda Profissional: O parceiro é crucial no estímulo ao tratamento (psicoterapia e/ou psiquiatria), oferecendo-se para agendar consultas ou acompanhar, mas respeitando os limites de que a responsabilidade pela cura é do profissional e do paciente.
  4. Cuidar de Si Mesmo: É vital que o parceiro também cuide de sua própria saúde mental, buscando seu espaço e, se necessário, sua terapia individual ou de casal.

 

Gênero e Depressão: Por Que as Mulheres Apresentam Maior Prevalência?

A literatura científica mundial e brasileira é bastante consistente ao apontar que as mulheres têm uma propensão significativamente maior de desenvolver e ser diagnosticadas com depressão do que os homens.

A Disparidade Estatística

De modo geral, estudos de prevalência ao longo da vida (risco de ter tido depressão em algum momento da vida) mostram que a proporção é de aproximadamente duas mulheres para cada homem diagnosticado com depressão.

  • Mulheres: A prevalência ao longo da vida pode chegar a 20%.
  • Homens: A prevalência ao longo da vida gira em torno de 12%.

Essa diferença acentuada costuma surgir a partir da adolescência, mais precisamente após a menarca (primeira menstruação), e se mantém na idade adulta.

Por Que as Mulheres Deprimem Mais? Uma Abordagem Multifatorial

Não existe uma única causa para essa disparidade, mas sim uma complexa interação de fatores biológicos, hormonais, psicossociais e culturais.

1. Fatores Biológicos e Hormonais

As oscilações hormonais no corpo feminino parecem ser um fator de vulnerabilidade:

  • Ciclo Reprodutivo: As variações de estrogênio e progesterona ao longo do ciclo menstrual, na gravidez (depressão perinatal) e, principalmente, no pós-parto (depressão pós-parto) e na perimenopausa e menopausa, estão fortemente associadas a episódios depressivos e de ansiedade.
  • Processos Inflamatórios: Algumas pesquisas sugerem que processos inflamatórios no cérebro das mulheres podem abrir portas para a depressão de uma forma que não ocorre nos homens, diminuindo a sensibilidade a recompensas.

2. Fatores Psicossociais e Culturais

O peso das expectativas sociais e as desigualdades de gênero impõem estressores crônicos às mulheres:

  • Dupla ou Tripla Jornada: Muitas mulheres acumulam a responsabilidade profissional, a maior parte do trabalho doméstico e o cuidado com os filhos ou familiares idosos (“carga mental”), resultando em estresse crônico e esgotamento.
  • Violência e Abuso: Mulheres são, mais frequentemente vítimas de violência, negligência e abusos de diversas ordens (físicos, sexuais, emocionais) na infância e na vida adulta. Esses eventos traumáticos são fortes preditores para o desenvolvimento de transtornos de humor.
  • Desigualdade Econômica: A persistente diferença salarial e as barreiras na carreira (o “teto de vidro”) geram estresse financeiro e profissional.

3. Diferença na Expressão e Busca por Ajuda

Outro ponto crucial é a maneira como os sintomas são manifestados e o quanto o gênero influencia a procura por diagnóstico:

Gênero Manifestação Comum da Depressão Busca por Ajuda
Mulheres Sintomas mais “típicos” (tristeza, apatia, culpa), maior sintomatologia somática (alterações no apetite, peso e sono). Maior propensão a se abrir sobre o sofrimento emocional e a buscar psicólogos e psiquiatras, facilitando o diagnóstico.
Homens Sintomas mascarados por irritabilidade, raiva, comportamento de risco (uso de álcool/drogas), isolamento social, e somatização (dores físicas inexplicáveis). Maior resistência em admitir vulnerabilidade e procurar ajuda, devido a construções sociais da masculinidade que desvalorizam a expressão de sentimentos.

A diferença na prevalência de diagnóstico pode, em parte, refletir o fato de que a depressão nos homens é frequentemente subdiagnosticada ou confundida com outros problemas (como abuso de substâncias ou transtorno explosivo intermitente), já que eles manifestam a doença de formas menos “clássicas” e culturalmente mais aceitas para o seu gênero (como a raiva e o controle).

 

A Visão Psicanalítica: A Depressão como Crise do Desejo

Para a Psicanálise, a depressão (que se diferencia da melancolia, mas com pontos de contato) muitas vezes está relacionada a uma crise na economia psíquica do sujeito, especificamente no que se refere ao Desejo e à Perda/Luto.

Na visão psicanalítica, o deprimido pode estar:

  • Paralisado pela Falta: O sujeito se recusa ou tem dificuldade em elaborar uma perda (real ou simbólica) ou em lidar com a falta inerente à vida. Como disse Lacan, o problema do amor é que “o que falta a um não é o que existe, escondido, no outro” – a tentativa de buscar no parceiro uma completude impossível pode gerar frustração e depressão.
  • Preso a um Objeto Perdido: Como Freud explorou em “Luto e Melancolia”, o melancólico (e, por extensão, o deprimido) lida com uma perda, mas, diferentemente do luto saudável, a sombra do objeto perdido recai sobre o próprio Eu. Ele se critica, se desvaloriza e se sente indigno, agredindo a si mesmo no lugar de agredir o objeto que se foi.

Neste contexto, o parceiro amoroso pode, inconscientemente, representar a âncora ou o gatilho para essas questões profundas:

  • Parceiro como Testemunha: O apoio amoroso e incondicional do parceiro atua como um testemunho da realidade fora da bolha de desvalorização do deprimido. Ele prova, por sua presença e paciência, que o sujeito merece ser amado e tem valor, confrontando a narrativa interna de culpa e indignidade.
  • Parceiro como Desafio ao Isolamento: A persistência amorosa do parceiro desafia a tendência de retirada e isolamento do deprimido, que muitas vezes é um mecanismo de defesa inconsciente. Ao se manter presente, o parceiro oferece um vínculo com o mundo externo e com a vida, facilitando que o deprimido comece a reinvestir seu desejo em algo que não seja apenas a sua própria dor.

É importante entender que a presença empática e informada do parceiro não é apenas um conforto, mas um fator terapêutico potente que protege o indivíduo de cair na espiral da solidão e potencializa a eficácia do tratamento profissional. É no reconhecimento da fragilidade do outro, sem julgamentos, que o amor se prova como uma força de resiliência e cura.

 

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