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O tarifaço norte-americano sobre a carne brasileira entrou em vigor em junho de 2025, impondo sobretaxas de até 50% sobre os embarques nacionais. A medida foi recebida como uma ameaça bilionária ao setor pecuário, já que projetava-se uma queda de até 70% nas exportações diretas para os Estados Unidos, um dos mercados mais lucrativos do planeta.
O que os números mais recentes revelam, porém, é que esse rombo não se concretizou na mesma intensidade. Isso porque parte da carne brasileira parece estar chegando aos EUA por meio de rotas alternativas envolvendo México, Paraguai e Uruguai, que compraram mais do Brasil ao mesmo tempo em que ampliaram suas próprias vendas aos americanos.
O peso das tarifas
Para entender a polêmica, é preciso olhar para os números das tarifas:
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Brasil → EUA: desde o tarifaço, a carne brasileira paga 50% de sobretaxa, praticamente inviabilizando a venda direta.
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Uruguai → EUA: o Uruguai tem uma cota de 20 mil toneladas que entra com tarifa reduzida, em torno de 10%. Fora da cota, a alíquota é de 36,4% — ainda assim, menor que a brasileira.
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Paraguai → EUA: o Paraguai também conta com acesso por cotas específicas e tarifas reduzidas, na faixa de 10% a 26%, dependendo do corte e do regime.
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México → EUA: como integrante do acordo USMCA (antigo NAFTA), o México tem condições ainda mais vantajosas, com tarifas próximas de 0% para volumes dentro das cotas.
Ou seja: se a carne sai do Brasil diretamente para os EUA, paga 50%. Mas se ela passa por México, Paraguai ou Uruguai, pode entrar nos EUA com taxas muito menores — de 0% a 36%, dependendo do regime de cada país.
É essa diferença que levanta suspeitas de triangulação: o uso de países vizinhos como “ponte” para que a carne brasileira chegue aos Estados Unidos com tarifas mais baixas.
Brasil → México, Paraguai e Uruguai
Em julho de 2025, o México importou do Brasil US$ 205,8 milhões em carne bovina, alta de 112% frente a 2024, tornando-se o segundo maior comprador da proteína brasileira, atrás apenas da China.
O Paraguai multiplicou suas compras em quase 10 vezes, alcançando US$ 5,9 milhões. Já o Uruguai aumentou em 28%, somando US$ 32,2 milhões.
Esses números mostram que os três países vizinhos se tornaram destinos prioritários da carne brasileira logo após a aplicação do tarifaço.
México, Paraguai e Uruguai → Estados Unidos
No mesmo mês, os três ampliaram suas próprias vendas de carne aos Estados Unidos:
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México: US$ 224,8 milhões (recorde em 40 anos);
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Uruguai: US$ 80,2 milhões (+44%);
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Paraguai: US$ 22,5 milhões (+225%).
A coincidência entre o aumento das compras desses países ao Brasil e o crescimento de suas exportações aos EUA alimenta a hipótese de uma possível triangulação.
Debate em aberto
Se confirmada, a triangulação configuraria uma espécie de fraude de origem, em que o produto é verdadeiro, mas a etiqueta de origem é maquiada para escapar das tarifas — algo comparável a um “contrabando de bandeira”.
Já a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (ABIEC) e representantes do setor negam qualquer irregularidade. Para eles, trata-se apenas de uma diversificação legítima de mercados: os países vizinhos consomem parte da carne brasileira e usam sua própria produção para exportar aos Estados Unidos.